Capítulo 1 - O Aeroporto

Acabara de chegar ao aeroporto, cansadíssima de ouvir o taxista lamuriar-se da vida que o Governo lhe estava a fazer, de ouvir todas as histórias que faziam dele o melhor soldado de um qualquer batalhão do regimento de infantaria, onde teria combatido no ultra-mar, as suas malas pesadíssimas faziam-na lembrar que voltara a exagerar na roupa e nos bens que levava, era sempre assim, cada vez que fazia as malas, começava a prometer a si mesma que só levava o essencial e acabava por se ver sentada em cima da mala, a tentar fechá-la. Agora ali à entrada do aeroporto e ignorando o mundo e ou quaisquer olhares, só pensava em descansar. O ultimo mês tinha-o passado dentro do centro de investigação, rodeada de de computadores e papel, agora só sonhava em poder-se rodear de livros, arte, compras e sol. A viagem lowcost que encontrara na Internet era ideal para isso mesmo, fugir do mundo por uns dias, aproveitar e pintar um quadro novo para colocar lá em casa e espairecer. Tudo parecia perfeito, só faltavam as amigas que lhe prometeram a vir ajudar e despedir-se dela, sempre dava para a ajudarem a carregar a bagagem.
Na fila para o check-in, baixara-se para tirar o papel com o código impresso, que seria o bilhete, para variar, tirava umas 10 cópias, só para ter a certeza de que não se esquecia de nada, "és um psicótico" pensou Bruno, por estar sempre tão preocupado em controlar a situação, mesmo assim, tinha uma habilidade incrível para se esquecer ou atrapalhar, devido à acumulação de coisas. Depois de tirar a chave do cadeado que fechava a bagagem da carteira, de retirar o bilhete, levanta-se e repara que uma rapariga acabara de lhe passar à frente, antes de reclamar, pensou que estava de férias e que podia esperar, nesse entretanto, não conseguiu deixar de reparar no corpo da jovem morena que carregava malas enormes, envergonhado por estar a admirar tão directamente, começou por sorrir ao sentir-se tão admirador, e por estar a fugir à habitual seriedade, de facto aquele momento, era bem melhor que reuniões, papeis, conferências ou servidores. As calças de ganga não deixavam fugir as linhas traçadas perfeitamente pelo corpo, como se desenhada a carvão e feita à sua imagem, ela ia guardando toda a sua atenção. O top azul justo, deixava ver um pouco das costas, logo após o sedoso cabelo negro e mesmo antes de um traseiro e uma pernas, que embirravam em prender-lhe a atenção. " Alguma filha de um riquinho que veio viajar sozinha porque lhe apeteceu, só pode, com um cabelo assim tão bem tratado e com este ar tão sério, só pode mesmo, ou então mais uma que tem um namorado rico e faz papel de miss... até pode ter um corpo excelente, mas deve ser tão mimada e tão falsa como as outras, concerteza que o primeiro tipo de blaser relusente e com um bonito porta-chaves a leva em dois tempos e o paspalho do actual namorado fica a ver navios em casa, ou então uma daquelas feministas rídiculas que só sabe falar mal dos homens..." pensou ele, e tentou desviar o olhar e o pensamento, um pouco sem sorte... pois no momento em que ia para pegar no telemóvel e verificar se tinha mensagens, começou a ouvir um enorme alarido...
Eram 4 , a anunciarem-se ao aeroporto todo com risos e saltos, as amigas de Lina tentavam a todo o custo chegar a tempo de se despedirem da amiga, e como tal, irrompiam pelo átrio do check-in a correr,a rir e a chamá-la, parando apenas brevemente para apreciarem os dois pilotos que passavam de malas feitas. Puxando a Sara e a Lorena que ficaram a sorrir para os mesmos e a clamarem " Call me! my number is...ehehehe", a Carlinda e a Mafalda, ofegavam para chegarem junto da amiga. Lina ria-se e delirava pela loucura das amigas, recebendo-as com abraços e saltos, aproveitou para descontrair e delirar um pouco, farta que estava de estar à espera.
Os risos, saltos e loucuras eram tantos, que era impossível não notar nas 4 raparigas, que irrompiam, alegres e prontas a anunciarem ao mundo que estavam ali. Vinham directamente na sua direcção, e cedo deu para perceber que eram amigas da rapariga da frente, pela maneira como olhavam e estendiam os braços. Ao chegarem mais perto a rapariga saiu da fila e foi de encontro a elas poucos metros ao lado, deixando apenas as malas. Era linda, tinha de admitir, se a sua beleza de costas, já o deixava irrequieto, de frente não podia ser melhor. Sem pensar no aspecto que poderia estar a dar, Bruno percorreu, o corpo por completo, da jovem que tinham um andar, tão felino, que parecia ensaiado. Um sorriso simples, de lábios delineados, maçãs vermelhas de corada, olhos castanhos e cabelo comprido, fizeram com que de repente, pensasse que não houvia problemas em estar naquela fila, e que afinal nem era tão mau assim estar ali atrás dela. Nisto o seu pensamento foi logo levado ao seguinte, mais matreiro, estava ali a oportunidade que ele precisava, para recuperar o seu lugar "roubado injustamente", pela rapariga. Lentamente, pegou nas suas malas e passou à frente das malas dela, enquanto a mesma falava com as amigas, e distraídas abraçavam-se e falavam ao mesmo tempo de tudo, numa velocidade incompreensível, à mente masculina. Agora que tinha passado à frente, bastava-lhe pegar no telemóvel, ligar a alguém e fingir-se ocupado, " a menina riquinha" como pensava, tinha voltado ao seu lugar e não era aquele "look" de brasa autêntica que o iria fazer ceder.
A Lorena não parava de brincar com a Sara, acerca dos pilotos, " Não perceberam nada, deviam ser estrangeiros, e de certeza que eram gays, não nos ligaram nenhuma...mas eram giros!" afirmava a Lorena, " Eu por mim acho que é a farda, há qualquer coisa na farda..." dizia a Sara, "Loucas ... voçês não mudam nada", cortava a Lina. " Olha, não sei...só sei que vamos cá ficar e hoje vamos para o Lux as 4, porque temos de aproveitar esta Sexta-Feira, o fim-de-semana está aí, e tu sabes como é dificil juntar as Divas" dizia a Mafalda, enquanto fazia de conta que estava a começar a dançar, esticando os braços bem alto, começando a abanar a anca, e aproveitando para piscar o olho ao homem que a olhava pasmado, junto do que deveria ser a sua mulher. "Olha..só sei que és uma reles! Dizes que vais ter com a Clara, mas acho que deve ser mentira! Admite, arranjaste um espanhol, numa daquelas conferencias cientificas e ele prometeu-te dar-te umas "Tapas" ehehehe",brincava a Carlinda enquanto abraçava a amiga..." Hei...hei.. eu não sei mas acho que o moço aí à frente pelo menos já vai contente, desde que chegámos que não pára de te apreciar o rabiosque" interrompeu a Lorena. " Quem?! o da fila? Ei! sacana! ele tava atrás de mim, já se aproveitou para me passar." , "pois pois, mas eu vi-o primeiro, a Lorena tem homem no Brasil, a Carlinda é quase casada com o novo amor, Ricaaaaardo, ehehe,que encontrou em Coimbra, isto de ser relações publica, eheheh e a Mafalda..bem a Mafalda está distraída, portanto se é para se meter com gajos eu tou à frente" brincava a Sara, mas não te preocupes miga, se ele te quiser eu cedo-o, o importante é tu deixares de tentar ficar para tia.
Ficaram ali a brincar e a falar de tudo até se despedirem mesmo antes de Lina entrar para a zona de embarque. A jovem morena aproveitou para passar a zona comercial a pente fino, até à hora de embarque, tentando esquecer um pouco as conferencias e os males do mundo, mas era dificil pois aqui e ali um jornal de uma bancada ou uma revista faziam questão de mostrar esta ou aquela foto de Africa ou Asia a evidenciar alguma guerra ou problema, era uma lutadora por natureza, uma daquelas pessoas que simplesmente lhe custava acreditar como poderia este mundo ser tão cruel e tão cheio de problemas que poderiam facilmente ser resolvidos, mas 'isso agora tinha de ficar para trás' pensava, tinha de tirar realmente férias. Era das últimas a fazer check-in, mas ainda deu para chegar bem a tempo de sacos agarrados a cada mão e ainda a tentar trincar mais um pouco do chocolate que se atrevera a comprar como gula. O avião estava cheio de velhotes que iam de férias, não era bem este o início da viagem que gostava de ter, mas era apenas o início da viagem, pegou na revista que se escondia no bolso do banco da frente, mesmo depois do habitual plano de emergência e começou a desfolha-la. Onde estaria o rapaz que vira na fila? Esse era bem mais novo, sempre dava para ter uma vista melhor, enfim agora teria de se contentar com o casal de velhotes que discutia o medo de voar, e todas as vantagens e desvantagens de andar de avião, portanto a revista seria um excelente refugio.
Bruno, aborrecido de depois do check-in ainda não ter visto uma rapariga mais nova que 60 anos na fila para embarcar, deliciava-se com as poucas hospedeiras que ia vendo. 'Estas mesmo solteiro e a precisar de namorada rapaz...isto é triste...' pensava, criticando o seu lado menos cavalheiresco de pensamentos. Ao entrar no avião foi colocado mesmo lá atrás, junto do que descobriu rapidamente ser o 'grupo de reformados de Cucujães', pois as t-shirts e os bonés de amarelo vivo, assim o anunciavam ao mundo. Entusiasmados com tal viagem em grupo comecaram a atormenta-lo com conversas sobre tudo e mais alguma coisa da terra e da vida de todos, algo que o fez automaticamente virar para a janela e tentar aninhar-se no cantinho mais pequeno possivel, para que pudesse passar despercebido e a viajem ser o mais rápida possível. Puxou da resvista e lembrou-se que não vira a morena da fila no embarque, levantou-se e espreitou, mas não a viu, onde estaria? Ela vinha neste avião era uma certeza, e quem lhe dera ter aquela bela mulher ao seu lado ao invés dos 'classicos', betinha ou mimada, era infinitamente melhor que a companhia actual, além disso tinha de admitir que o olhar cruzado que trocara quando as amigas dela começaram a aumentar o tom de riso, tinha tido algum efeito. Enfim tentou esquecer o assunto e ler todos os textos e detalhes da revista da companhia aerea para não pensar mais em mulheres, pelo menos até Barcelona.